Transforma-se o amador na cousa amada,
por virtude do muito imaginar;
não tenho logo mais que desejar,
pois em mim tenho a parte desejada.
Se nela está minha alma transformada,
que mais deseja o corpo de alcançar?
Em si somente pode descansar,
pois consigo tal alma está liada.
Mas esta linda e pura semidéia,
que, como o acidente em seu sujeito,
assim co’a alma minha se conforma,
Está no pensamento como idéia;
[e] o vivo e puro amor de que sou feito,
como matéria simples busca a forma.
CAMÕES, Luís Vaz de. Obra completa.
Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1988. p.301
Vocabulário
Liada: unida, ligada.
Semideia: semideusa.
O eu lírico abre o soneto com uma tese que será a base do raciocínio desenvolvido no texto: se quem ama (amador) alcança uma identificação total com o ser amado, não pode desejar mais nada, porque já traz consigo tudo o que quer. O processo de transformação é desencadeado pelo "muito imaginar". Trata-se, portanto, de um processo amoroso em que o eu lírico vai perdendo sua identidade e se "moldando" à forma perfeita da amada.
Na segunda estrofe, a tese é retomada: a transformação da alma (espírito) deve aplacar o desejo do corpo (matéria). Como as dias almas que se amam estão ligadas, o desejo carnal deixa de ser importante.
A mulher amada é caracterizada, nos tercetos, como uma semideusa (linda e pura) cuja perfeição é própria da esfera das essências. Por isso ela se manifesta no pensamento do eu lírico como "ideia" (resgate do conceito platônico) e faz com que ele, inspirado por um amor também puro e transformador, molde-se a essa forma simples e perfeita. É o fim do processo de purificação amorosa que caracteriza o neoplatonismo.
Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1988. p.301
Vocabulário
Liada: unida, ligada.
Semideia: semideusa.
O eu lírico abre o soneto com uma tese que será a base do raciocínio desenvolvido no texto: se quem ama (amador) alcança uma identificação total com o ser amado, não pode desejar mais nada, porque já traz consigo tudo o que quer. O processo de transformação é desencadeado pelo "muito imaginar". Trata-se, portanto, de um processo amoroso em que o eu lírico vai perdendo sua identidade e se "moldando" à forma perfeita da amada.
Na segunda estrofe, a tese é retomada: a transformação da alma (espírito) deve aplacar o desejo do corpo (matéria). Como as dias almas que se amam estão ligadas, o desejo carnal deixa de ser importante.
A mulher amada é caracterizada, nos tercetos, como uma semideusa (linda e pura) cuja perfeição é própria da esfera das essências. Por isso ela se manifesta no pensamento do eu lírico como "ideia" (resgate do conceito platônico) e faz com que ele, inspirado por um amor também puro e transformador, molde-se a essa forma simples e perfeita. É o fim do processo de purificação amorosa que caracteriza o neoplatonismo.
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