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sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Canção da Primavera - Mário Quintana

Primavera cruza o rio
Cruza o sonho que tu sonhas.
Na cidade adormecida
Primavera vem chegando.

Catavento enloqueceu,
Ficou girando, girando.
Em torno do catavento
Dancemos todos em bando.

Dancemos todos, dancemos,
Amadas, Mortos, Amigos,
Dancemos todos até
Não mais saber-se o motivo...

Até que as paineiras tenham
Por sobre os muros florido!

Jornalista, tradutor e escritor, Mário Quintana(1906 – 1994) nasceu na cidade de Alegrete (1906), no Rio Grande do Sul.

“Nasci no rigor do inverno, temperatura: 1 grau; e ainda por cima prematuramente, o que me deixava meio complexado, pois achava que não estava pronto. Até que um dia descobri que alguém tão completo como Winston Churchill nascera prematuro - o mesmo tendo acontecido a Sir Isaac Newton!”.

Após frequentar algumas escolas em sua cidade natal, é matriculado no Colégio Militar de Porto Alegre(1919), onde começou a produzir seus primeiros trabalhos na revista Hyloea, editada pelos próprios estudantes. Em 1924, deixa o referido colégio e emprega-se na Livraria do Globo (editora de renome nacional), onde trabalha por três meses com Mansueto Bernardi.

O talento para a literatura se manifestou cedo. Aos 20 anos, venceu um concurso promovido pelo jornal gaúcho “Diário de Notícias" com o conto “A Sétima Personagem”.

Em 1929 ingressou no jornal O Estado do Rio Grande. Após ter participado da Revolução de 1930, mudou-se para o Rio de Janeiro. Retornou, em 1936, para a Livraria do Globo, em Porto Alegre, onde trabalhou sob a direção de Érico Veríssimo. Traduziu Charles Morgan, Rosamond Lehman, Lin Yutang, Proust, Voltaire, Virginia Woolf, Papini, Maupassant, Balzac, Gram Greene, Conrad, dentre outros. Com certeza, foi um dos responsáveis pelo acesso do povo brasileiro às obras da literatura internacional.

Seu primeiro livro de poesias, A Rua dos Cataventos, que reúne sonetos de influência parnasiana, é publicado em 1940 ( coletânea que passou a ser inserida em diversos livros escolares). Entre suas principais obras, estão Aprendiz de feiticeiro (1950), Antologia poética (1966), Caderno H (1973) e A vaca e o hipogrifo (1977). Dentre os livros que escreveu para crianças, destacam-se Pé de Pilão (1966), Lili inventa o mundo (1983) e Nariz de vidro (1984).

A poesia de Quintana é marcada pelo lirismo, pelo bom humor e pela crítica voltada à massificação característica das sociedades contemporâneas. Focalizando temas aparentemente simples (como o amor, a vida, a morte, a velhice e a religiosidade) seus poemas incorporam a fantasia e o universo da infância.

Com excepcional capacidade de cativar leitores( talvez porque soubesse extrair reflexões e sentidos de eventos do dia a dia, quase banais, com leveza, ternura e sutil ironia), Quintana era também admirado por poetas como Drummond, Vinícius e Cecília Meireles. De Manuel Bandeira, recebeu elogios:

Meu Quintana, os teus cantares
Não são, Quintana, cantares:
São, Quintana, quintanares

Quinta essência de cantares...
Insólitos, singulares...
Cantares? Não! Quintanares!

Em uma entrevista, chegou a dizer que a sua vida estava descrita nos seus poemas:

"Minha vida está nos meus poemas, meus poemas são eu mesmo, nunca escrevi uma vírgula que não fosse uma confissão".

Em 1960, foi publicada a sua “Antologia poética”, organizada por Rubem Braga e Paulo Mendes Campos, com mais de 60 poemas inéditos. A obra teve boa repercussão no meio editorial e recebeu o Prêmio Fernando Chinaglia como melhor livro do ano.

Despreocupado em relação à crítica, faz poesia porque "sente necessidade", segundo suas próprias palavras.

O poeta candidatou-se três vezes à Academia Brasileira de Letras, mas nunca lhe deram a vaga. Depois da terceira recusa, ele ironizou os imortais com seu conhecido “Poeminha do Contra”:

Todos esses que aí estão
Atravancando meu caminho,
Eles passarão...
Eu passarinho!

O poeta recebeu inúmeras homenagens durante a vida, mas morreu negando as reverências:

Dizem que sou modesto. Pelo contrário, sou tão orgulhoso que acho que nunca escrevi algo à minha altura. Porque poesia é insatisfação, um anseio de autossuperação. Um poeta satisfeito não satisfaz.

Em 1980 recebe da Academia Brasileira de Letras o prêmio Machado de Assis, pelo conjunto de sua obra. Em 1981, foi agraciado com o prêmio Jabuti de Personalidade Literária do Ano.

O Príncipe dos Poetas Brasileiros (como era conhecido) faleceu com quase 90 anos.

"Amigos, não consultem os relógios quando um dia me for de vossas vidas... Porque o tempo é uma invenção da morte: não o conhece a vida - a verdadeira - em que basta um momento de poesia para nos dar a eternidade inteira".

Comentários sobre o poema

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Canção da Primavera” é um texto que se apresenta na forma de três quartetos e um dístico final, mostrando-nos a intenção deliberada do autor de fazer um poema que celebrasse a chegada da Primavera, em versos heptassílabos.

O eu lírico passa-nos a ideia da chegada suave da nova estação, a estação da vida, da florescência e do amor. No primeiro verso, o substantivo rio, contribui para realçar os conceitos de vida (água = fonte da vida) e da passagem do tempo (simbolizada no correr das águas). Este ressurgimento de novas esperanças de vida é realçado também pelo sonho, fonte de fruição dos desejos (“o sonho que tu sonhas”).

Repare que o ritmo e as sonoridades da primeira estrofe acentuam o caráter lírico da composição. No primeiro verso, temos a aliteração do “r” (“Primavera cruza o rio”), a anáfora com o segundo verso (cruza/cruza), ao que se soma a metonímia encontrada no terceiro verso ("cidade adormecida") e o hipérbato (aqui desfeito): “Primavera vem chegando na cidade adormecida”.

Logo em seguida, o eu lírico descreve as transformações ocorridas com a chegada da Primavera e a reação das pessoas. É um momento de festa, de liberdade e de não interdição, simbolizada no enlouquecimento do catavento e na igualdade dos homens, que se encontram sem diferenças sociais, o que é expresso pelo coletivo bando, e que, dançando em torno do catavento, parecem cúmplices da sua loucura. Enfatizando esse aspecto, temos a repetição no uso do gerúndio (girando, girando), aproximando a loucura do catavento à dos homens.

Todos são convocados para esta dança de sagração da Primavera: as amadas, os mortos, os amigos. E, já que todos sabem o motivo desta dança ( a chegada da estação do amor, das flores e da esperança), devem dançar até a extenuação, ou até que os muros (as interdições, as proibições e os obstáculos construídos pelos homens) estejam plenamente floridos graças ao espírito da Primavera.

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

Consoada - Manuel Bandeira

Quando a Indesejada das gentes chegar
(Não sei se dura ou caroável),
Talvez eu tenha medo.
Talvez sorria, ou diga:
— Alô, iniludível!
O meu dia foi bom, pode a noite descer.
(A noite com os seus sortilégios.)
Encontrará lavrado o campo, a casa limpa,
A mesa posta,
Com cada coisa em seu lugar.

Vocabulário
Consoada: refeição noturna
Coroável: carinhosa, amável
Iniludível: a quem não pode iludir
Sotilégios: mistérios

Acompanhar a trajetória de Manuel Bandeira é ter oportunidade de contato com etapas realmente significativas da evolução poética do século XX. Sempre pensando que morreria cedo, por causa de sua pouca saúde, acabou vivendo muito e legando uma das mais densas heranças humanísticas da nossa literatura. Seu primeiro livro, A cinza das horas, de 1917, evidencia traços parnasianos e simbolistas, e revela a marca registrada de toda a sua poesia futura: sentimentalismo mesclado de amargura.

“A vida é amarga. O amor, um pobre gozo...
Hás de amar e sofrer incompreendido,
Triste lírio franzino, inquieto, ansioso,
Frágil e dolorido...”

Carnaval (obra que marca o início da libertação das formas fixas), de 1919, inaugura sua entrada no movimento modernista (do qual foi chamado "O São João Batista do Modernismo" por Mário de Andrade). Mas ele nunca participou ativamente do grupo paulista, apesar de ter enviado um poema para a Semana de Arte Moderna: Os Sapos (um dos mais vaiados pelo público que compareceu ao Teatro Municipal de São Paulo, declamado por Ronald de Carvalho).

"Pouco me deve o movimento; o que eu devo a ele é enorme. Não só por intermédio dele vim a tomar conhecimento da arte de vanguarda na Europa ( da literatura e também das artes plásticas e da música), como me vi sempre estimulado pela aura de simpatia que me vinha do grupo paulista. " (Manuel Bandeira, Itinerário de Pasárgada.)


Em Ritmo dissoluto (1924), os poemas de Bandeira associam grande maturidade técnica e um lirismo impregnado de descobertas do cotidiano, poeticamente transfiguradas.

Muitos críticos consideram que seu ponto alto como modernista se dá no livro Libertinagem(1930), quando desenvolve plenamente a renovação: a fuga do “belo” tradicional em poesia, a incorporação da linguagem coloquial e popular(a temática do dia-a-dia, com poemas tirados de notícias de jornal, de frases corriqueiras, orientados, como os demais, por tom irônico e, às vezes, trágico) a evocação da infância e a morte, sempre presente, velha confidente. Esses elementos prosseguirão em Estrela da manhã (1936) e estarão presentes nas obras seguintes.

Retomando certos motivos já explorados por poetas românticos (a saudade, a infância, a solidão) e procurando estreitar os laços entre poesia e cultura popular, Manuel Bandeira mantém, de fato, alguns pontos de contato com o Romantismo, mas é um poeta essencialmente modernista. Jamais cai, por exemplo, num sentimentalismo piegas ao lembrar-se da infância: uma fonte inesgotável de emoção poética. A infância que evoca é uma experiência vivida e concreta, não idealizada, que, contrastada com o presente, acentua-lhe a condição trágica.

A solidão, que levava os poetas ultrarromânticos a buscarem na morte a saída para os problemas da existência, em Manuel Bandeira toma outra direção – a da paixão do poeta pela vida:

“O que eu adoro em tua natureza,
Não é o profundo instinto maternal
Em teu flanco aberto como uma ferida.
Nem a tua pureza. Nem a tua impureza.
O que eu adoro em ti – lastima-me e consola-me!
O que adoro em ti, é a vida.”

É inegável que a convivência com a possibilidade de morrer colocada desde cedo diante do poeta (Bandeira tinha apenas 17 anos quando descobriu a doença e, naquela época, a tuberculose era uma doença com poucas chances de cura) imprimiram a sua poesia uma capacidade única de captar as emoções do cotidiano. Desenganado várias vezes pelos médicos, foi impedido de continuar os estudos na área de engenharia, em função das muitas viagens que teve que fazer para tratamento(casas de saúde situadas em estações climáticas do Brasil e da Europa).

“Criou-me, desde eu menino
Para arquiteto meu pai.
Foi-se-me um dia a saúde...
Fiz-me arquiteto? Não pude!
Sou poeta menor, perdoai!”



Mesmo morrendo após os 80 anos, a moléstia fez com que Manuel Bandeira convivesse continuamente com a morte (muitas vezes com angústia e uma espécie de resignação, mas algumas vezes com ironia e irreverência ) e se voltasse mais para dentro de si mesmo, deixando que isso transbordasse em muitos de seus versos. Ele sempre acreditou que morreria cedo e que não teria tempo para construir uma vida familiar e profissional. Refugiava-se, então, nas lembranças do passado, diante da imaginada impossibilidade do futuro.

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Consoada é uma pequena ceia noturna; pode também significar “ceia de Natal” e, em português mais antigo, “presente de Natal”. É para essa ceia que o eu lírico espera a morte, através de um eufemismo (“a indesejada das gentes”), que pode chegar dura ou “coroável” ( a palavra vem de “caro” e que dizer “amigável, favorável”, até mesmo “querida”). Essa atitude diante da Morte(Alô, iniludível!) não é de medo ou pessimismo. É como se ele a recebesse para um jantar, a fim de compartilhar com ela uma refeição amistosa, sem nada de trágico ou doloroso.

Tal disposição, aparentemente contraditória, de coragem e descaso, é traduzida por outros recursos estilísticos (pois o texto é predominantemente metafórico), como por exemplo:

No uso da antítese (“não sei se dura ou coroável”, “o meu dia foi bom, a noite pode descer”) e o uso do subjuntivo e da palavra talvez, indicando o clima constante de dúvida (“talvez eu tenha medo” — repare que todos os termos, aqui, foram empregados em seu sentido próprio,denotativo).

Mas, surpreendentemente, este clima de incerteza é logo desfeito: as metáforas dos últimos versos(a mesa e as particularidades da casa, por exemplo, são metáforas das “coisas da vida”) deixam perceber que o eu lírico está pronto para a morte, já que sua vida foi adequadamente cumprida.

A simplicidade da linguagem é impressionante; a intensidade lírica também (o encontro com a morte é tranquilo, transmitindo-nos forte sensação de completude, de satisfação com a própria existência). Conclui-se que a atitude do eu lírico diante da morte é de quem espera uma visita certa, íntima, amiga e por isso digna de fraterna recepção.