Neste sermão, Vieira utiliza seu poder argumentativo para tratar da
tarefa do pregador em uma terra corrompida.
Fragmento...
Vós, diz Cristo, Senhor nosso, falando com os pregadores, sois o sal da
terra: e chama-lhes sal da terra, porque quer que façam na terra o que faz o
sal. O efeito do sal é impedir a corrupção; mas quando a terra se vê tão
corrupta como está a nossa, havendo tantos nela que têm ofício de sal, qual
será, ou qual pode ser a causa desta corrupção? Ou é porque o sal não salga, ou
porque a terra se não deixa salgar. Ou é porque o sal não salga, e os
pregadores não pregam a verdadeira doutrina; ou porque a terra se não deixa
salgar e os ouvintes, sendo verdadeira a doutrina que lhes dão, a não querem
receber. Ou é porque o sal não salga, e os pregadores dizem uma cousa e fazem
outra; ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes querem antes imitar
o que eles fazem, que fazer o que dizem. Ou é porque o sal não salga, e os
pregadores se pregam a si e não a Cristo; ou porque a terra se não deixa
salgar, e os ouvintes, em vez de servir a Cristo, servem a seus apetites. Não é
tudo isto verdade? Ainda mal!
Suposto, pois, que ou o sal não salgue ou a terra se não deixe salgar;
que se há-de fazer a este sal e que se há-de fazer a esta terra? O que se há-de
fazer ao sal que não salga, Cristo o disse logo: Quod si sal evanuerit, in quo
salietur? Ad nihilum valet ultra, nisi ut mittatur foras et conculcetur ab
hominibus. «Se o sal perder a substância e a virtude, e o pregador faltar à
doutrina e ao exemplo, o que se lhe há-de fazer, é lançá-lo fora como inútil
para que seja pisado de todos.» Quem se atrevera a dizer tal cousa, se o mesmo
Cristo a não pronunciara? Assim como não há quem seja mais digno de reverência
e de ser posto sobre a cabeça que o pregador que ensina e faz o que deve, assim
é merecedor de todo o desprezo e de ser metido debaixo dos pés, o que com a
palavra ou com a vida prega o contrário.
Isto é o que se deve fazer ao sal que não salga.
Atividades propostas
1- Nesse sermão, os pregadores são comparados ao sal da terra. Qual é,
segundo o texto, a função daquele que prega?
a) Vieira inicia o sermão com a fala de Cristo aos pregadores para fazer
um questionamento aos seus ouvintes. Qual é ele?
b) Explique por que esse questionamento é, na verdade, uma estratégia
para iniciar o raciocínio que será apresentado ao longo do texto.
2 – Releia
“Ou é porque o sal não salga, ou porque a terra se não deixa salgar.”
a) A partir desse trecho, Vieira levanta hipóteses sobre os motivos
pelos quais a pregação não consegue eliminar a corrupção. Quais são os motivos
por ele apontados?
b) Segundo o texto, que razões têm os fiéis para não acatarem as
palavras dos pregadores?
c) De que recurso estilístico Vieira se vale para construir a sua argumentação? Explique.
d) Explique de que maneira esse recurso contribui para que a
argumentação seja eficaz e convença os leitores.
3 – Qual é a conclusão que Vieira chega sobre o pregador?
4 – Você acha que as colocações feitas por Vieira permanecem válidas até
hoje? Nos dias atuais, ainda é possível identificar “o sal que não salga” e “a
terra que não se deixa salgar”? Explique.