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quinta-feira, 30 de abril de 2020

Funções da linguagem - Parte 2



Funções da linguagem (continuação)

Função fática (ou de contato)



Função fática. Aspectos da função fática - Português

Na função fática, enfatiza-se o canal de comunicação ou de contato.  A intenção é iniciar um contato por meio de cumprimentos (Olá!", "Como vai?", "Bom dia!", "Oi!") ou de uma abordagem coloquial objetiva e rápida ("Está tudo bem?", "Você precisa de ajuda?").

Observe, no texto a seguir, que as personagens visam uma interação verbal.

"Olá, como vai?
Eu vou indo e você, tudo bem?
Tudo bem, eu vou indo, correndo
Pegar meu lugar no futuro, e você?"


VIOLA, Paulinho da. LP Foi um rio que passou em minha vida, EMI, 1970

Para não esquecer:

Quando o objetivo da mensagem é simplesmente o de estabelecer ou manter a comunicação, o contato entre o emissor e o receptor, diz-se que a função predominante é a fática.


Função metalinguística

A função metalinguística tem como fator essencial o código. O objetivo da mensagem é referir-se à própria linguagem. Podem-se encontrar exemplos dessa função em uma cena de filme que analise o cinema, em um poema que fale sobre o poeta e a poesia, em verbetes de dicionários, em textos que estudem e analisem outros textos.

fazendo a barba



Para não esquecer:

A função metalinguística está presente no discurso que utiliza o código para explicar o próprio código.


"di.ci.o.ná.rio
sm (lat dictione) Coleção de vocábulos de uma língua, de uma ciência ou arte, dispostos em ordem alfabética, com o seu significado ou equivalente na mesma ou em outra língua. Sin: léxico, vocabulário, glossário. D. vivo: indivíduo muito erudito ou de grande memória.
"

(Definição retirada do Dicionário Michaelis)


Função apelativa (ou conativa)

Aqui, o objetivo da transmissão da mensagem é persuadir o receptor. Os melhores exemplos são os textos publicitários, pois visam envolver o leitor, influenciar seu comportamento e seduzi-lo com uma mensagem persuasiva.

Observe no texto a seguir, extraído de um anúncio publicitário, uma característica típica da função apelativa: verbos empregados no modo imperativo (fuja, escolha, procure) e pronomes na 2.ª ou 3.ª pessoas ( o seu agente de viagens).


Fuja do engarrafamento.

“UMA SEMANA EM BÚZIOS A PARTIR DE R$.290,00. É MAIS DO QUE UM PACOTE. É UM PRESENTE.

Vinte e seis praias numa cidade-resort. O primitivo em harmonia com o sofisticado a poucas horas de São Paulo. Escolha a pousada com café da manhã e um passeio de barco grátis. Procure o seu agente de viagens e conheça este pacote nos mínimos detalhes.”


Função poética

A função poética ocorre quando se enfatiza a mensagem ou o texto, quando é trabalhada a própria forma da linguagem. A ênfase recai sobre a construção do texto, a seleção e a disposição de palavras no texto. Essa função é mais encontrada em poemas, mas aparece também  em textos publicitários, em prosa e em outros.

Observe esta mensagem. O som, o ritmo, os jogos de ideias e de imagens são explorados no texto, e a linguagem pode atrair o leitor.

Tecendo a manhã

“ Um galo sozinho não tece uma manhã:
ele precisará se,pré de outros galos.
De um que apanhe esse grito que ele
e o lance a outro; de um outro galo
que apanhe o grito que um galo antes
e o lance a outro; e de outros galos
que com muitos outros galos se cruzem
os fios de sol de seus gritos de galo,
para que a manhã, desde uma teia tênue,
se vá tecendo, entre todos os galos
(...)”

(MELO NETO,João Cabral de. Poesias completas. Rio de Janeiro:José Olympio,1986)


Observações:

a) diferença entre a função poética e a função emotiva

Função emotiva enfatiza o eu, e está em 1° pessoa. Onde ele expressa suas emoções,sensações,sentimentos... Indo ao ponto, a diferença é que na função emotiva ele só se preocupa com o eu, o foco é no emissor, já na função poética ele se preocupa mais com quem vai receber a mensagem.

b) diferentes funções

É importante lembrar que uma mesma mensagem pode ter diferentes funções. Nesses casos, cabe identificar sua função principal, pois sempre há predominância de uma função sobre as demais.





quarta-feira, 22 de abril de 2020

Funções da linguagem - Parte 1

Funções da linguagem

 Hagar                            Eddie
MARIA DO ROSÁRIO DA SILVA ALBUQUERQUE BARBOSA

Observe a "tirinha" apresentada. 
Ela estabelece  uma situação comunicacional em que Hagar (o emissor) transmite uma mensagem a seu amigo Eddie (receptor);

"Meu Hamlet é afiado como uma lâmina!"
"Não diga! Não dói quando você o abraça?"

O código utilizado é a língua portuguesa e o canal, a língua oral. O referente (assunto da mensagem) é Hagar falar a respeito da inteligência do filho e Eddie entender outra coisa.

A realização da comunicação, como você já aprendeu aqui no blog, depende de seis fatores principais. Vamos recapitular como age cada um deles em particular:

1) emissor (ou locutor) - quem fala ou transmite a mensagem a alguém.
2) receptor (ou interlocutor) - quem recebe a mensagem pelo emissor.
3) mensagem - a informação ou o texto transmitido pelo emissor.
4) código - o sistema de sinais que permite a compreensão da mensagem.
5) canal - o meio empregado para o envio da mensagem.
6) referente - o contexto ou o assunto da mensagem.

Leia com bastante atenção!

Em todo processo de comunicação, a linguagem é expressa de acordo com a função que se deseja enfatizar. No momento em que se estabelece uma comunicação verbal, um dos fatores essenciais vistos acima acaba prevalecendo e determinando uma das funções da linguagem.

seis funções da linguagem: referencial, emotiva, apelativa, fática, metalinguística e poética.

Agora que o "mistério" foi desfeito, vamos estudar  cada função em particular?

Função referencial (ou denotativa)

Essa função ocorre quando o destaque na comunicação é o referente, ou seja, o objeto da mensagem ou a situação nela abordada. A intenção do emissor é transmitir informações sobre o referente. Os textos científicos, jornalísticos e didáticos representam exemplos dessa função da linguagem.

Leia o texto jornalístico a seguir, em que o emissor transmite a mensagem ao receptor, informando-lhe sobre os riscos do uso excessivo do petróleo.

O mundo sem petróleo

         “Em breve, os seres humanos terão de aprender a viver sem o petróleo. Não porque ele vá acabar no futuro próximo – os especialistas garantem que as reservas mundiais são mais do que suficientes para satisfazer as necessidades do planeta por até 75 anos. Mas porque continuar usando o combustível que move a economia mundial com essa voracidade faz mal à saúde da Terra. (...)”.


Almanaque 2003 – Superinteressante. São Paulo: Abril.


Para não restar dúvidas, mais um enfoque com conteúdo essencialmente informativo, que bem exemplifica essa função.

A moda na era viking

   “Minúsculas lâminas de ouro encontradas em sítios arqueológicos na Escandinávia permitem que se saiba mais sobre a vestimenta, os cortes de cabelo e as práticas religiosas dos vikings. As guldgbuggers, lâminas do mais recentes, foram achadas em áreas vikings junto a sítios cerimoniais. ‘Talvez fossem tíquetes para festivais religiosos’, diz Per O. Thomsen, do museu Svendborg o Omegns, que escavou guldgbuggers no sul da Dinamarca. Algumas trazem desenhos de animais, mas a maioria exibe figuras humanas.”

National Geographic Brasil. n. 2, jun. 2000. v. 1.

Função emotiva (ou expressiva)

Na função emotiva, dá-se ênfase  a linguagem do emissor. Observa-se o envolvimento pessoal do emissor, que comunica sentimentos, inquietações, emoções, avaliações e opiniões centradas na expressão do "eu", do seu mundo interior. Em geral, os textos poéticos são bons exemplos dessa função porque apresentam uma linguagem subjetiva que enfoca as próprias sensações do emissor. 
Detalhe:
lembre-se que a função emotiva só se preocupa com o EU (estado de ânimo) e o foco é no emissor.

Veja esse poema de Alberto Caeiro (heterônimo de Fernando Pessoa) e observe como são explorados pronomes e verbos na 1.ª pessoa.

O guardador de rebanhos

V - Há Metafísica Bastante em Não Pensar em Nada

"Há metafísica bastante em não pensar em nada.
O que penso eu do mundo?
Sei lá o que penso do mundo!
Se eu adoecesse pensaria nisso.

Que idéia tenho eu das cousas?
Que opinião tenho sobre as causas e os efeitos?
Que tenho eu meditado sobre Deus e a alma
E sobre a criação do Mundo? (...)"

Não sei. Para mim pensar nisso é fechar os olhos
E não pensar. É correr as cortinas
Da minha janela (mas ela não tem cortinas).
(...)"

PESSOA, Fernando. Obra completa. Rio de Janeiro: Nova Aguiar, 1982.

Vocabulário/Glossário (para você entender o significado de algumas palavras).
Metafísica- é uma palavra que tem origem grega, e pode ser entendida como aquilo que está além da física, onde metà, significa “além de”, “depois de” e physis, significa “física” ou “natureza”. É um ramo do conhecimento ligado a filosofia, e que busca uma compreensão da essência das coisas, daquilo que faz as coisas serem como são.

Voltando ao assunto:

A função emotiva pode estar presente em vários tipos de textos e gêneros textuais.Perceba: são opiniões, pensamentos individuais, juízos de valor,  sensações e sentimentos.  Em outras palavras, ocorre quando o emissor é posto em destaqueObserve como ela pode manifestar-se nas histórias em quadrinhos (tirinha):







segunda-feira, 11 de abril de 2016

Vila Rica (fragmento) - Cláudio Manuel da Costa



Claudio Manuel da Costa nasceu em Minas Gerais, em 1729. Com apenas 20 anos embarcou para Portugal com a finalidade de completar seus estudos na Universidade de Coimbra. Retornou ao Brasil entre 1753 e 1754. Dedicou-se ao Direito, exercendo a função de advogado jurista, procurador da Coroa portuguesa, desembargador e secretário de governo, o que lhe permitiu acumular grande fortuna.

Promovia saraus em que, além de declamar seus poemas, ouvia textos escritos por poetas com os quais compartilhava amizade. Em 1789, foi acusado como um dos conspiradores na Inconfidência Mineira. Morreu de maneira enigmática, em uma das celas onde ficara preso, nesse mesmo ano. Seu pseudônimo como poeta era Glauceste Satúrnio.

A obra poética de Cláudio Manuel da Costa procura adequar à paisagem local aos padrões do Arcadismo. Sua obra, no entanto, também mostra uma expressão nacionalista. É o que se pode notar em uma passagem (fragmento) de um de seus textos mais famosos: Vila Rica.

Cantemos, Musa, a fundação primeira 
Da Capital das Minas; onde inteira 
Se guarda ainda, e vive inda a memória, 
Que enche de aplauso de Albuquerque a história. 

Tu, pátrio ribeirão, que em outra idade 
Deste assunto a meu verso, na igualdade 
De um épico transporte, hoje me inspira 
Mais digno influxo; por que entoe a lira; 

Porque leve o meu canto ao clima estranho 
O claro herói, que sigo, e que acompanho: 
Faze vizinho ao Tejo, enfim que eu veja 
Cheias de Ninfas de amorosa inveja.

[...]

Essa passagem trata da fundação de Vila Rica, primeira capital de Minas Gerais. A inspiração vem do “pátrio Ribeirão”, que faz que o eu do poema sinta-se transportado para um sentimento épico, ainda que se encontrasse em um “clima estranho”, isto é, em um local que não seria próprio para esse tipo de “canto” (poema).

Em resumo, há na poesia de Cláudio Manuel da Costa um desajuste entre o desejo de fazer um poema nos moldes neoclássicos, com cenários pastoris e tomado de um clima épico ou lírico, e aquilo que a paisagem brasileira de Minas Gerais, composta de montanhas e florestas virgens, permite. Ou seja, o poeta compõe uma obra dividida entre as regras da poesia árcade e a realidade brasileira.

Dica

A poesia de Cláudio Manuel da Costa quase sempre apresenta uma tensão interna, muitas vezes uma contradição. O eu do texto expressa uma divisão entre o modelo neoclássico-europeu, inspirado na cultura grega e romana – e a necessidade de falar de sua terra, de seu povo e das circunstâncias em que vive. Quer falar, portanto, de algo próximo, e não de uma realidade artificial, como a criada em muitos poemas do período.

Para saber mais...




segunda-feira, 28 de março de 2016

Sermão de Santo Antônio aos Peixes - Padre Antônio Vieira



Neste sermão, Vieira utiliza seu poder argumentativo para tratar da tarefa do pregador em uma terra corrompida.

Fragmento...

Vós, diz Cristo, Senhor nosso, falando com os pregadores, sois o sal da terra: e chama-lhes sal da terra, porque quer que façam na terra o que faz o sal. O efeito do sal é impedir a corrupção; mas quando a terra se vê tão corrupta como está a nossa, havendo tantos nela que têm ofício de sal, qual será, ou qual pode ser a causa desta corrupção? Ou é porque o sal não salga, ou porque a terra se não deixa salgar. Ou é porque o sal não salga, e os pregadores não pregam a verdadeira doutrina; ou porque a terra se não deixa salgar e os ouvintes, sendo verdadeira a doutrina que lhes dão, a não querem receber. Ou é porque o sal não salga, e os pregadores dizem uma cousa e fazem outra; ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes querem antes imitar o que eles fazem, que fazer o que dizem. Ou é porque o sal não salga, e os pregadores se pregam a si e não a Cristo; ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes, em vez de servir a Cristo, servem a seus apetites. Não é tudo isto verdade? Ainda mal!

Suposto, pois, que ou o sal não salgue ou a terra se não deixe salgar; que se há-de fazer a este sal e que se há-de fazer a esta terra? O que se há-de fazer ao sal que não salga, Cristo o disse logo: Quod si sal evanuerit, in quo salietur? Ad nihilum valet ultra, nisi ut mittatur foras et conculcetur ab hominibus. «Se o sal perder a substância e a virtude, e o pregador faltar à doutrina e ao exemplo, o que se lhe há-de fazer, é lançá-lo fora como inútil para que seja pisado de todos.» Quem se atrevera a dizer tal cousa, se o mesmo Cristo a não pronunciara? Assim como não há quem seja mais digno de reverência e de ser posto sobre a cabeça que o pregador que ensina e faz o que deve, assim é merecedor de todo o desprezo e de ser metido debaixo dos pés, o que com a palavra ou com a vida prega o contrário.
Isto é o que se deve fazer ao sal que não salga.

Atividades propostas

1- Nesse sermão, os pregadores são comparados ao sal da terra. Qual é, segundo o texto, a função daquele que prega?
a) Vieira inicia o sermão com a fala de Cristo aos pregadores para fazer um questionamento aos seus ouvintes. Qual é ele?
b) Explique por que esse questionamento é, na verdade, uma estratégia para iniciar o raciocínio que será apresentado ao longo do texto.

2 – Releia

“Ou é porque o sal não salga, ou porque a terra se não deixa salgar.”

a) A partir desse trecho, Vieira levanta hipóteses sobre os motivos pelos quais a pregação não consegue eliminar a corrupção. Quais são os motivos por ele apontados?
b) Segundo o texto, que razões têm os fiéis para não acatarem as palavras dos pregadores?
c) De que recurso estilístico Vieira se vale para construir  a sua argumentação? Explique.
d) Explique de que maneira esse recurso contribui para que a argumentação seja eficaz e convença os leitores.

3 – Qual é a conclusão que Vieira chega sobre o pregador?

4 – Você acha que as colocações feitas por Vieira permanecem válidas até hoje? Nos dias atuais, ainda é possível identificar “o sal que não salga” e “a terra que não se deixa salgar”? Explique.




sábado, 26 de março de 2016

À cidade da Bahia – Gregório de Matos



Triste Bahia! Ó quão dessemelhante 
Estás e estou do nosso antigo estado! 
Pobre te vejo a ti, tu a mi empenhado, 
Rica te vi eu já, tu a mi abundante.

A ti trocou-te a máquina mercante, 
Que em tua larga barra tem entrado, 
A mim foi-me trocando, e tem trocado, 
Tanto negócio e tanto negociante.

Deste em dar tanto açúcar excelente 
Pelas drogas inúteis, que abelhuda 
Simples aceitas do sagaz Brichote.

Oh se quisera Deus que de repente 
Um dia amanheceras tão sisuda 
Que fora de algodão o teu capote!


Vocabulário
Bahia – cidade de Salvador
estado – situação, condição de vida
empenhado – endividado
trocar – nos dois sentidos: comerciar e mudar
máquina mercante – as naus do comércio
deste em dar – principiaste, começaste a dar
dessemelhante - diferente
simples – droga, remédio
brichote – estrangeiro ( pejorativo)
sisuda – ajuizada, modesta
capote – capa larga e longa

Gregório de Matos Guerra (1636 – 1696) nasceu na Bahia, estudou em colégios jesuítas de Salvador e se formou em Direito pela Universidade de Coimbra, em Portugal, onde trabalhou como jurista e conheceu a produção literária de sua época. Em 1682, retornou à Bahia, assumindo o cargo de tesoureiro-mor da Sé. Doze anos depois, em função dos poemas satíricos contra governantes da Bahia, foi deportado para Angola, de onde voltaria apenas um ano antes de morrer, estabelecendo-se no Recife.

Como Gregório não publicou  livros em vida  seus poemas circulavam sobretudo oralmente e em cópias manuscritas  e há muita dificuldade em identificar sua obra, ela só veio a ser amplamente conhecida no século XVIII, por meio de cópias feitas por diferentes pessoas, sem nenhum rigor. Atualmente, vários poemas presentes nesses códices têm sua autoria contestada e atribuída a outros poetas.

Independentemente da legitimidade dessa autoria, Gregório é hoje a assinatura poética de uma obra numerosa, variada e rica, que abrange poesia lírica, religiosa, encomiástica e satírica, revelando grande desenvoltura nos jogos de linguagem e de idéias tão cultuados pela literatura barroca.

Comentários

A poesia satírica é muito provavelmente a parte mais popular da obra de Gregório de Matos. Pelas críticas frequentes e impiedosas a políticos (algumas de caráter pessoal) e à organização social da Bahia e da Colônia de um modo geral, o poeta ficou conhecido pelo apelido de “Boca do inferno”.

Em “À cidade da Bahia”, o poeta critica a exploração da Bahia por comerciantes estrangeiros, especialmente os ingleses, ação que opera uma transformação tanto no lugar quanto na vida dele.


Sendo uma obra conceptista, esse soneto desenvolve o pensamento de modo engenhoso, exigindo do leitor um maior esforço para a compreensão pelo refinado jogo intelectual de paradoxos e sutilezas lógicas. Observe sua estrutura:

• nos dois quartetos, o poeta compara  as transformações de sua vida com as da vida da cidade.O paralelismo dos versos e das construções sintáticas, os jogos de palavras e as antíteses atribuem densidade expressiva à comparação.

• nos tercetos, o poeta ocupa-se apenas da cidade No primeiro, formula uma explicação para o atual estado em que ela se encontra. No segundo, indica uma solução, exprimindo o desejo de que ela passe a ter um estilo de vida mais simples.

A estruturação conceptista do poema não impede, entretanto, os recursos expressivos próprios do cultismo, como o uso intensivo de aliterações.


Atividades propostas

No soneto, a Bahia, personificada, é objeto das recriminações do poeta, como frequentemente ocorre em seus poemas satíricos.

1 – Nas duas primeiras estrofes, ele faz um paralelo entre a sua vida e a da cidade, descrevendo as transformações que ambas sofreram.
a) Qual era a antiga situação de suas vidas?
b) E a situação presente?

2 – A antítese é uma das figuras de linguagem mais utilizadas pela literatura barroca.
a) Liste as antíteses utilizadas por Gregório de Matos e indique a que tempo (passado ou presente) cada palavra se refere.
b) O que revela o uso intenso da antítese no poema?

3 – A vida do poeta foi mudada pelos maus negócios e pelos negociantes mais espertos que ele. A que ele atribui às mudanças de estado da cidade?

4 – Releia a terceira estrofe e responda: segundo o poeta, por que a Bahia, na época a maior exportadora mundial de açúcar, tinha tanto prejuízo no comércio internacional?

5 – Na última estrofe, ele formula um desejo, exprimindo-se por meio da metáfora do “capote de algodão”. Explique o desejo do poeta e a importância da metáfora na composição do poema.





quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Prece - Fernando Pessoa


Senhor, a noite veio e a alma é vil.
Tanta foi a tormenta e a vontade!

Restam-nos hoje, no silêncio hostil,
O mar universal e a saudade.

Mas a chamma, que a vida em nós creou,
Se ainda ha vida ainda não é finda.
O frio morto em cinzas a ocultou:
A mão do vento pode erguel-a ainda.

Dá o sopro, a aragem — ou desgraça ou ancia —
Com que a chamma do esforço se remoça,
E outra vez conquistemos a Distancia —
Do mar ou outra, mas que seja nossa!



A poesia assinada por Fernando Antônio Nogueira Pessoa “ele mesmo” — ou Fernando Pessoa ortônimo — escrita em língua portuguesa (sua produção poética inicial foi em língua inglesa, compilada sob o título genérico de English poems) deve ser dividida, para fins didáticos, em líricas e saudosista – nacionalista.

A poesia lírica, reunida nos livros Cancioneiro e Quadras ao gosto popular, nos revela um poeta que retorna alguns temas, ritmos e formas tradicionais do lirismo português. Em Cancioneiro, principalmente, temos poesias que apresentam uma reflexão sobre a própria arte poética e sobre o papel desempenhado pelo artista!(“o poeta é um fingidor”), ao lado de poesias que sondam o “eu - profundo” (“novelo embrulhado para o lado de dentro”). E se pudermos afirmar que Alberto Caeiro “pensa” com os sentidos, que Álvaro de Campos “pensa” com a emoção, e que Ricardo Reis “pensa” com a razão, podemos afirmar que Fernando Pessoa “ele – mesmo” “pensa” com a imaginação:

Isto

Dizem que finjo ou minto
Tudo o que escrevo. Não.
Eu simplesmente sinto
Com a imaginação.
Não uso o coração.

Tudo o que sonho ou passo,
O que me falha ou finda,
É como que um terraço
Sobre outra coisa ainda.
Essa coisa que é linda.

Por isso escrevo em meio
Do que não está ao pé,
Livre do meu enleio,
Sério do que não é.
Sentir? Sinta quem lê!

A poesia saudosista – nacionalista de Fernando Pessoa tem seu ponto alto no livro Mensagem. Aqui encontramos um Fernando Pessoa identificado com o sentimento nacionalista que tomou conta de Portugal em meio às crises do primeiro período republicano, gerando, aliás, o movimento da Renascença Portuguesa (relembramos que Fernando Pessoa colaborou na revista A Águia, órgão desse movimento). É uma volta ao passado, retomando a formação de Portugal, a identificação com o mar, o período das Grandes Navegações, D. Sebastião e o sonho de um império grande e forte:

“Porque é do portuguez, pae de amplos mares,
Querer, poder só isto:
O inteiro mar, ou a orlava desfeita —
O todo, ou o seu nada.”

Repare que Fernando Pessoa utiliza-se de uma grafia que alterna palavras em português moderno com outras em português arcaico.

Comentários

“Prece” é um poema carregado do saudosismo que caracteriza o livro Mensagem. A inevitável comparação entre o Portugal quinhentista das grandes navegações — quando Lisboa era considerada o “grande empório da Europa” e o império luso se estendia por quatro continentes — e o Portugal do início do século XX, mergulhado em profundas crises, gera um clima de melancolia — “a noite”, “a alma vil” e o “silêncio hostil” são as marcas do momento presente.

Mas, como o próprio nome indica, o poema é uma prece, ou seja, uma súplica, um pedido. Uma prece para que Portugal retome o seu lugar na história e se posicione entre os países conquistadores. Nesse ponto, o poema assume um otimismo suplicante mantendo viva a idéia da “chamma” que iluminará o caminho da reconstrução nacional. Fernando Pessoa utiliza brilhantemente a imagem da “mão do vento” como fonte alimentadora do sonho explorando uma duplicidade: “a mão do vento” inflou as velas das naus portuguesas no passado e ergue a chama da esperança no presente.

Chamamos sua atenção para dois recursos expressivos utilizados pelo poeta:
a) a sonoridade do poema, com realce para o verso “Se ainda ha vida ainda não é finda”, em que o poeta trabalhou a vogal aberta «a» combinada à longa vogal nasal «i»;
b) a força expressiva do pronome possessivo nossa que fecha o poema.