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quinta-feira, 4 de março de 2010

O Barroco

Para uma compreensão adequada do estilo Barroco, faz-se necessário retroceder na história e chegar a Idade Média. No período medieval, a figura de Deus domina toda a cultura, gerando uma visão de mundo denominada teocentrismo, ou seja, Deus é considerado o centro do Universo. Assim, a vida terrena (material) parece algo passageiro, um estágio em que o homem prepara sua alma para a salvação ou para a danação eterna. Considera-se o espírito como o bem supremo e a matéria como coisa pecaminosa. Entende-se a vida carnal como uma espécie de ilusão, uma imperfeição, e o homem é conduzido a procurar uma realidade suprema no plano divino. Essa foi, em linhas gerais, a visão de mundo dominante na Idade Média.


Nos séculos XVI e XVII, grandes mudanças políticas, econômicas e filosóficas consolidam uma tendência oposta, conhecida como Renascimento, que conduz a uma nova maneira de enxergar o mundo: o antropocentrismo, isto é, o homem considerado como sendo o centro do universo. No antropocentrismo, o homem não é tão-somente imagem de Deus, mas é visto como ser humano, ligado a sua natureza física. O espiritualismo e a religiosidade medievais cedem lugar à valorização dos aspectos materiais da existência. O teocentrismo entra em declínio e a Igreja começa a perder sua liderança. Isso não significa, entretanto, que a religiosidade medieval tenha desaparecido. Ela apenas perde sua predominância, mas continua existindo em estado latente, para tornar-se de novo evidente na época do Barroco.


Uma comparação entre os dois períodos mostraria:

Idade Média

Temas religiosos misturados às inquisições habituais. Anseio de espiritualidade para combater instintos carnais;

Misticismo (crença no sobrenatural);

Ascetismo (desvalorização do corpo e dos sentidos em favor dos bens espirituais);

Teocentrismo;

Cristianismo;

Sentimentalismo, inspirado na cultura-ambiente, tratada com excesso de sentimento. Predomínio do lirismo amoroso.

Renascimento

Temas religiosos separados das inquietações habituais. Uns tratam apenas dos problemas espirituais, outros vêem mais a vida terrena. Exploração de temas que possam trazer imortalidade, consagração, glória;

Racionalismo (crença na Razão);

Materialismo (valorização dos bens corpóreos);

Antropocentrismo;

Paganismo;

Humanismo (mimese do mundo greco-latino, isto é, adaptação de temas artísticos da antiguidade clássica à época do Renascimento);


Supervalorização do homem (homem ideal, modelo universal).


A época de surgimento da estética barroca corresponde a um período marcado por profundas mudanças no espaço religioso, social e artístico. Constata-se que a instabilidade dos valores do homem daquele momento pode ser encontrada na crise entre a visão medieval teocêntrica e a concepção antropocêntrica do Renascimento; no aparecimento e crescimento da burguesia (mercadores e comerciantes) em contraposição à aristocracia (nobres e membros do clero); no conflito religioso entre a Reforma Protestante e a Contra-Reforma Católica.


A Reforma Protestante representa a ruptura com o poder monolítico da Igreja Católica. Lutero e Calvino lideram um movimento que provoca a separação de Roma e o surgimento de novas religiões: Luteranismo e Calvinismo. A autoridade absoluta do Catolicismo é colocada em dúvida, o que significa uma nova correlação de forças e uma disputa pelo domínio dos fiéis. Também na Inglaterra, por motivos distintos, o rei Henrique VIII funda uma nova religião, o Anglicanismo, contrapondo-se ao poder do papa e a influência dos católicos.


A Igreja Católica reage, fundando em 1540 a Companhia de Jesus, de padres jesuítas. Seus dirigentes e representantes reúnem-se no Concílio de Trento (1545-1563), preparando uma ofensiva, uma tentativa de reconquistar os ´´fiéis desgarrados`` para o Protestantismo. Esse movimento é conhecido como Contra-Reforma.


A literatura produzida e divulgada estava sob a influência do racionalismo renascentista, do gosto pelas coisas terrenas e da visão humanista, aliada à ideia renovada de reconduzir o homem à Igreja, na condição de servo espiritual, através da tradição medieval que retorna sob a força da Inquisição, da Contra-Reforma e da educação jesuítica.


Disso resulta uma arte que une os valores renascentistas e medievais, o racionalismo à fé. O encanto pelos bens materiais, pelos prazeres, pelo luxo (valores da burguesia) se soma às crenças na eternidade, no inferno ou paraíso (valores absolutos da igreja medieval refortificada pela Contra-Reforma).


Valores tão opostos (razão-fé, mundo terreno-mundo espiritual, dor-prazer, sensualidade-espiritualidade) e idéias tão antagônicas acabam por gerar uma literatura cuja linguagem é fundamentada em antíteses. O Barroco foi mais que um movimento artístico, uma forma de compreender um mundo onde forças contrárias impeliram o homem a uma atitude dualista.


Tudo isso conduz ao aparecimento do homem pessimista, em permanente conflito interior, colocado em contínuo dualismo, nele coexistindo dois princípios ou posições contrárias (lama x corpo, bem x mal, matéria x espírito, paganismo x cristianismo, amor x sofrimento etc), refletindo, no artista, uma visão exagerada e deformada da realidade.


O nome barroco tem origem, provavelmente, numa palavra utilizada no século XVI para designar um tipo de pérola que tinha forma irregular. A palavra´´ irregular `` é bem adequada para o caso, pois mostra uma das características fundamentais do estilo barroco: a tensão, que é conseqüência de uma visão de mundo que procura conciliar tendências contraditórias, uma visão de mundo que busca a fusão do velho com o novo.


O estilo barroco é o meio de expressão do homem da época, saudoso ´´da religiosidade medieval e ao mesmo tempo, seduzido pelas solicitações terrenas e pelos valores do mundo – amor, dinheiro, luxo, aventura, posição social``(Afrânio Peixoto)


Voltado para o céu e, no mesmo tempo, sem conseguir desligar-se dos valores terrenos, o homem da época sente-se em conflito entre a razão e a fé, entre os sentidos e o espírito, tentando encontrar um ponto de união entre essas forças que o atraem. O homem barroco vai enfatizar tudo aquilo que é inconsistente, tudo o que muda de aparência, tudo o que está em movimento, pois para ele o mundo é uma coisa dinâmica, em constante mudança. Veja, por exemplo, como um elemento da natureza (a água) aparece num texto barroco:


´´Claras as águas são, e transparentes,

Que de si manam copiosas fontes,

Umas regam os vales adjacentes,

Outras descendo vêm dos altos montes.``


(Frei Manuel de Santa Maria Itaparica)


No Brasil, devemos considerar como marco inicial do movimento a publicação da obra Prosopopéia do português Bento Teixeira, em 1601. Nesse poema de escasso valor literário, uma derivação imitativa de Os Lusíadas de Camões, o poeta exalta os donatários da Capitania Hereditária de Pernambuco e seu desenvolvimento.


Embora a designação Barroco seja aceita universalmente, notamos que o período pode ser denominado de formas diferentes, segundo alguns fenômenos relacionados a determinados países:


Gongorismo (Espanha): derivado do nome do poeta Luís de Gôngora y Argote. Seiscentismo (Portugal): ano de 1600. Visão puramente histórica, em função do ano relativo ao século em que se deu o fenômeno.

Salesianismo (Alemanha): derivado do nome do poeta Angelus Salesius.

Eufuísmo (Inglaterra): derivado do título do romance Euphues, de Jonh Lilly.

Marinismo (Itália): peça influência exercida por Luis Vicenti Marini .

Preciosismo (França): pelo culto à forma extremamente rebuscada na corte de Luís XVI, o Rei Sol. Segundo Manuel Bandeira, nos ´´salões a galanteria degenerou uma afetação, afetação de maneiras e linguagem, que passou a chamar-se preciosismo, mais tarde satirizado por Molière em sua comédia As preciosas ridículas``.


Características barrocas


Dualismo


Trata-se de uma atitude que designa o culto do contraste tão tipicamente barroco. Assim, o homem sempre estava entre dois aspectos: o racionalismo mundano e o antiterreno teocêntrico. Os textos literários seiscentista refletem esse dualismo, mostrando-se rebuscados, extravagantes, valorizando os detalhes, o jogo de palavras e as figuras de linguagem (metáfora, antítese, hipérbole, alegorias).


´´Anjo no nome, Angélica na cara!

Isso é flor, e Anjo juntamente:

Ser Angélica flor, e Anjo florente,

Em quem, senão em vós, se uniformara:``


( Gregório de Matos)


´´Sinto-me sem sentir, todo abrasado

no rigoroso fogo que me alenta;

O mal que me consome me sustenta.

O bem que me entretém me dá cuidado.``


(Antônio de Bacelar)

Sensorialismo


Presença constante de impressões sensoriais, pelo emprego de palavras que designam sensações táteis, auditivas, olfativas, gustativas e, sobretudo, visuais.Os olhos já não servem para refletir a ordem e a harmonia do mundo, mas para alimentar os movimentos da alma.


´´A margem de uma fonte, que corria

Lira doce dos pássaros cantores

A bela ocasião das minhas dores

Dormindo estava ao despertar do dia.

..........................................................

Porém, abrindo Sílvia os dois diamantes,

Tudo à Sílvia festeja, e tudo adora

Aves cheirosas, flores ressonantes.``


(Gregório de Matos)


´´Ardor em firme coração nascido;

pranto por belos olhos derramado;

incêndio em mares de água disfarçado;

rio de neve em fogo convertido.``


Neste fragmento, Gregório de Matos, além do culto ao contraste, percebe o mundo principalmente através dos sentidos: o ardor é uma sensação térmica, assim como o fogo; água e a neve também dão ideia de temperatura, embora oponham-se pelo tato (uma é liquida, a outra é sólida); o pranto e o mar, elementos que pelo tato percebemos serem líquidos e que pelo paladar percebemos serem salgados, opõem-se a rio e neve, que são insípidos.

Fusionismo


Fusão de luz e trevas, de sons. Na arte barroca, o artista não se limita a expor os contrários, porém quer fundi-los, conciliá-los, integrá-los, através de uma linguagem profundamente metafórica.


Feísmo


Trata-se de uma preferência por aspectos cruéis e dolorosos da existência, revelando uma época de profundas incertezas. Esse momento é marcado pela ideologia resultante da Idade Média, resgatada pela Igreja, onde o homem deveria observar que a vida é um processo doloroso que visa a aprimorar o espírito.


Culto do efêmero


Normalmente, a arte barroca dá ênfase à transitoriedade das coisas, em oposição à mentalidade clássica que buscava o perene da existência. O mundo é visto como algo instável, sujeito a metamorfoses e inconstâncias. A ideia da beleza como algo finito está intimamente ligada a essa ênfase sobre a brevidade das coisas.


´´Nasce o Sol, e não dura mais que um dia,

Depois da Luz se segue noite escura,

Em tristes sombras morre a formosura,

Em contínuas tristezas a alegria.``


(Gregório de Matos)


Atitude lúdica


O termo lúdica deriva de “ludo” que significa jogo. Portanto, podemos notar que na arte barroca nos proporciona um eterno jogo de contrastes, enredando-nos em verdadeiros labirintos sintáticos e semânticos que, muitas vezes, nos levam a um niilismo temático.


Gosto pelas antíteses e paradoxos:


a) antíteses – esta figura, que consiste no emprego de palavras, expressões ou frases de significações contrárias, reflete o dualismo e o conflito do homem barroco:


´´Os vivos são pó levantado, os mortos são pó caído.``


(Vieira)


b) paradoxo – esta figura também reflete o dualismo e o conflito do homem barroco. O paradoxo é uma antítese que contém uma contradição, devido à união de idéias contrárias ao senso comum e aparentemente inconciliáveis:


´´ enquanto a gentil descortesia

o ar, que fresco Adônis te namora,

te espalha a rica trança brilhadora,

quando vem passear-te pela fria.``


(Gregório de Matos)


Aspectos construtivos


Cultismo


O termo cultismo também é conhecido como “culteranismo” ou “gongorismo” e designa um processo construtivo que excede nas utilizações das figuras de linguagem, causando um rebuscamento formal, uma excessiva ornamentação estilística ou um preciosismo. Normalmente, os textos cultistas são extravagantes, herméticos e, não raro, de gosto duvidoso. Essa supervalorização da forma é mais comum na poesia. Observe, no fragmento seguinte, o extremo cuidado formal que leva o poeta a engendrar um esquema no qual o final de cada verso repete-se no início seguinte.


´´Ofendi-vos, Meu Deus, é bem verdade,

É verdade, Senhor, que hei delinqüido,

Delinqüido vos tenho e ofendido,

Ofendido vos tem minha maldade.``


(Gregório de Matos)


Conceptismo


O termo conceptismo deriva de “conceito”, idéia. Portanto esse termo indica um jogo de idéias. Esse processo construtivo também é conhecido como “Quevedismo”, por causa do escritor espanhol Quevedo. Resulta, finalmente, numa elaboração racional, numa retórica aprimorada, através de um jogo de conceitos. Quando analisamos um raciocínio, devemos perceber se ele foi estruturado em bases verdadeiras, um silogismo, ou se em bases falsas ou metafóricas, um sofisma.


´´O todo sem a parte não é todo;

A parte sem o todo não é parte;

Mas se a parte o faz todo, sendo parte,

Não se diga que é parte, sendo todo.``


(Gregório de Matos)


Observe o jogo de idéias que conduz o raciocínio do leitor: só existe algo inteiro (´´todo``) se não lhe falta nada (nenhuma ´´parte``). Portanto, conclui o eu-lírico, a parte é (também) o todo.


Convém salientar que nenhum texto recorre exclusivamente a esses meios; podem ocorrer, simultaneamente, o cultismo e o conceptismo, até porque, ´´a expressão cuidada é requisito necessário para que as idéias engenhosas produzam o seu efeito.``Sendo assim, há autores conceptistas, que trabalham com idéias opostas, raciocínios paradoxais, e autores cultistas que trabalham com a linguagem rebuscada.



Um comentário:

  1. Excelente explicação sobre o estilo Barroco. Abordou de forma simples, objetiva e completa. Foi muito importante para meus estudos. Parabéns

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